Tuesday, June 11, 2013

A caverna, José Saramago

A caverna, José Saramago

Quando o Centro recusa a entrega da olaria de Cipriano Algor, por causa dos clientes não querem mais a louça, os pratos e os cântaros de plástico sendo mais ligeiros e práticos do que os de barro, parece estar a chegar o fim de um período da sua vida.

Mas a sua filha tem outras ideias, e o Achado, o cão que fixa domicílio na casota da sua casa, vai mudar as suas ideias. Há também Isaura Estudiosa, a viúva que encontre no cemitério…

O senhor é um chefe, sou um chefe, de facto, mas só para aqueles que estão abaixo de mim, acima há outros juízes, O Centro não é um tribunal, Engana-se, é um tribunal, e não conheço outro mais implacável, Na verdade, senhor, não sei porque gasta o seu precioso tempo a falar destes assuntos com um oleiro sem importância, Observo-lhe que está a repetir palavras que ouviu de mim ontem, Creio recordar que sim, mais ou menos, A razão é que há coisas que só podem ser ditas para baixo, E eu estou em baixo, Não fui eu quem lá o pôs, mas está, Ao menos ainda tenho essa utilidade, mas se a sua carrera progredir, como certamente sucederá, muitos mais irão ficar abaixo de si, Se tal acontecer, o senhor Cipriano Algor, para mim, tornar-se-á invisível, Como o senhor disse há pouco, é assim a vida, É assim a vida.
O Centro é um símbolo múltiplo. Ao mesmo tempo centro comercial e edifício colossal onde a gente pode viver sem sair dele (as janelas não se abrem por causa do ar condicionado, a não ser por prevenir os suicídios dos habitantes), figura a alienação de um modernismo consumerista que corta a gente das suas raízes culturais e ecológicas. É também uma construção policial com os seus guardas residentes ou em condições para o ser, a hierarquia burocrata e militar dos chefes e subchefes, as deciséoes implacáveis e irremediáveis devidas ao mercado desumanizado da oferta e da procura.

Crítica social da nossa sociedade, A caverna abre-se com as palavras de Platão na República: «Que estranha cena descreves e que estranhos prisioneiros, são iguais a nós».

A caverna (editora Caminho, 2000, 350 páginas), escrito por (Golegã, Azinhaga, 1922 — Tías, Lanzarote, 2010).

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