As primeiras vítimas da epidemia de cegueira súbita, mergulhadas dum minuto para outro num mar de brancura leitosa, foram isoladas em quarentena num manicómio sem saída, guardados por soldados que tiveram ordem para matar qualquer que quisessem sair de lá.
A vida nas camaratas organisa-se pouco a pouco com a comida depositada cada dia na porta da entrada, mas sem nenhum vidente para os ajudar, torna-se mais e mais difícil, os homens e as mulheres num estado quase animal, com os sanitários repugnantes, até que um dia uma camarata torna-se contra as outras e exige um pagamento para conseguir as rações. Á cegueira física sobrepõe-se uma cegueira moral, como se sem os olhos para a ver, a moralidade reduza-se à um esforcço vão, inútil.
Um filme foi baseado neste romance em 2008, Ensaio Sobre a Cegueira, por Fernando Meirelles, com Julianne Moore.
Ensaio sobre a Cegueira (edição Caminho, 1995, 310 páginas), escrito em 1995 por José Saramago (Golegã, 1922 — Tías, 2010), Prémio Camões em 1995 e vencedor do Prémio Nobel de Literatura em 1998.
A vida nas camaratas organisa-se pouco a pouco com a comida depositada cada dia na porta da entrada, mas sem nenhum vidente para os ajudar, torna-se mais e mais difícil, os homens e as mulheres num estado quase animal, com os sanitários repugnantes, até que um dia uma camarata torna-se contra as outras e exige um pagamento para conseguir as rações. Á cegueira física sobrepõe-se uma cegueira moral, como se sem os olhos para a ver, a moralidade reduza-se à um esforcço vão, inútil.
A comida, por exemplo, estava lá fora e tardava. De uma camarate e da outra, alguns homens tinham ido postar-se no átrio, à espera de que a ordem soasse no altifalante. Mexiam os pés, nervosos, impacientes. Sabiam que iam ter de sair à cerca exterior para recolherem as caixas que os soldados, cumprindo-se o prometido, deixariam no espaço entre o portão e a escada, e temiam que houvesse ali um truque, uma armadilha, Quem nos diz que não vão disparar contra nós, Depois do que já fizeram, são bem capazes disso, Não podemos fiar-nos, Eu não vou lá fora, Nem eu, Alquém terá de ir, se quisermos comer, Não sei se mais vale morrer de um tiro, ou se ir morrendo de fome aos poucos, Eu vou, eu também, Não é préciso irmos todos, Os soldados podem não gostar, Ou assustar-se, julgar que queremos fugir, por causa disso, se calhar, é que mataram aquele da perna, Temos que nos decidir, Toda a cautela é pouca, lembrem-se do que sucedeu ontem, nove mortos sem mais nem menos, Os soldados tiveram medo de nós, e eu tenho medo deles, O que eu gostava de saber é se eles também cegam, Eles, quem, Os soldados, Na minha opinião, até deviam de ser os primeiros. Todos estiveram de acordo, sem contudo se perguntarem porquê, faltou alguém ali que desse a boa razão, Porque assim não poderiam disparar. O tempo passava, passava, e o altifalante mantinha-se calado.Como o podem ver, o estilo de José Saramago tem uma muita grande densidade pelo facto de integrar os diálogos diretamente no texto, com uma pontuação minimalista feita só de virgulas e maiúsculas.
Um filme foi baseado neste romance em 2008, Ensaio Sobre a Cegueira, por Fernando Meirelles, com Julianne Moore.
Ensaio sobre a Cegueira (edição Caminho, 1995, 310 páginas), escrito em 1995 por José Saramago (Golegã, 1922 — Tías, 2010), Prémio Camões em 1995 e vencedor do Prémio Nobel de Literatura em 1998.
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